Uma garota pedala pelas ruas
desertas de Budapeste, quando surge atrás dela centenas de cães avançando
rapidamente, furiosos, e aparentemente sedentos por vingança contra todos
aqueles que os maltrataram. É dessa forma, que inicia o surpreendente Deus
Branco (White God, 2014), pela cena inicial já percebemos que esse não é um “filme
de cachorro” comum, do tipo que é exibido na Sessão da Tarde, a obra do
húngaro Kornél Mundruczó é forte demais em comparação aos bobos dramas caninos que
passam na telinha (os quais não tenho a menor paciência), mas já pode ser
considerada a obra-prima desse subgênero.
Já no começo do longa, numa cena
que demonstra uma relação bem fria entre as personagens, a garota Lili (Zsófia
Psotta) é deixada pela mãe aos cuidados do pai, que deve ficar com ela por um tempo.
Lili traz com ela, o Hagen, o seu cachorro. O pai, que não suporta o cão, obriga
a filha a deixá-lo na rua. Eis aqui, mais uma cena tocante e incômoda.
A metade do filme se concentra em
duas narrativas paralelas, a do Hagen (“interpretado” muito bem por dois
labradores gêmeos, o Luke e o Body), passando por maus bocados pelas mãos de
homens inescrupulosos, e a de Lili, que tenta ter uma vida normal de
adolescente, enquanto procura pela cidade o seu cachorro.
O último ato de Deus Branco é o
melhor de todos, o drama ganha ares de suspense hitchcockiano, repleto de momentos brutais e sequências protagonizadas
por cachorros agindo como “humanos” de um jeito nunca visto no cinema, é nesse
ato que 200 cachorros saem pelas ruas
furiosos e vingativos (vale ressaltar, são cães de verdade, não são
computadorizados, o que torna a experiência ainda mais impressionante) causando
uma revolução canina e provocando histeria e pânico na população humana.
Deus Branco pode ser um filme “cruel”
demais para quem está acostumado com os “Marley e Eu” da vida, mas nada é em
vão, há muita crítica social e política embutida na história, a questão de
superioridade de raça também é explicitamente abordada no enredo, criticando o
homem pela sua hostilidade para com os cachorros, quando não os usam
para fins condenáveis, relação desenvolvida principalmente com aqueles animais que não são
de raça. Não por acaso, a maioria dos
personagens “humanos” no filme possui atitudes duvidosas.
Mas apesar de conter cenas
fortes, há também muita poesia na história, a cena final é um exemplo disso,
impactante e belíssima ao mesmo tempo. Deus Branco, além de revigorar os “filmes
de cachorro”, ser um produto de entretenimento de qualidade,
ganha mais relevância por motivar a discussão acerca da relação homem x
animal. Se o diretor e o elenco conseguiram estabelecer uma relação de
cooperação entre raças para filmar essa obra, então é possível que homem e cão
possam viver em harmonia, sem julgamentos, violência e senso de superioridade. Assista ao trailer!
Obs.: Não só o filme foi premiado
nos festivais afora, os labradores que interpretam o Hagen, também foram
laureados com o prêmio de melhor atuação canina em um filme. Merecidíssimo.
NOTA: 9,0
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