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25 de fevereiro de 2014

Clube de Compras Dallas



“Às vezes, sinto que estou lutando por uma vida que simplesmente não tenho tempo para viver”. Esta frase dita pelo protagonista Ron Woodroof (Matthew McConaughey) define bem o enredo do drama Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club, 2013). A luta de Ron em prolongar a sua vida após descobrir ser portador do vírus HIV é algo impressionante de testemunhar nessa obra do diretor Jean-Marc Vallée.

Woodroof é um texano machista, gosta de montar touros e fazer sexo sem proteção com mulheres em qualquer lugar, sempre que puder. Não por acaso, descobre possuir o vírus da Aids e segundo o médico, ele já deveria estar morto há tempos, e mais, dá-lhe apenas 30 dias de vida. Nos anos 80, a doença era vista como algo restrito apenas a homossexuais, então, o mundo de Ron parece desabar sob sua cabeça.

Leto e Matthew: atuações de corpo e alma.

Mas é nessa circunstância nebulosa que a vida de Ron tem uma reviravolta e acompanhamos a partir daqui a riqueza deste personagem que para nossa maior surpresa, foi um homem da vida real. Em vez de se prender a um leito de hospital, Ron sai em busca de remédios alternativos, ilegais e melhores que a droga experimental dada pelo hospital. Com uma visão empreendedora notável, o homem cria o seu clube de compras traficando medicamentos e lucrando com isto, mas também, começa a ajudar milhares de pessoas que estão na mesma condição que a sua.

A relação improvável entre o texano e um travesti (Jared Leto), que logo depois se torna seu sócio é um dos trunfos da fita. Leto e McConaughey, esguios de tão magros que estão, fizeram um trabalho exemplar, isso é incontestável e merecem o Oscar este ano nas categorias que estão indicados.

Clube de Compras Dallas é um filme sobre a luta para viver de um ser humano incrível e perseverante, é sobre a jornada de um homem que se agarrou à esperança e com isso transformou sua vida.

NOTA: 8,0


Falando nisso....


Never Wipe Tears Without Gloves



A descoberta e o impacto da Aids principalmente na comunidade gay nos anos 80 também são tratados em Never (Don´t Ever) Wipe Tears Without Gloves (Torka aldrig tårar utan handskar, 2012), minissérie sueca de três capítulos.

A cidade de Estocolmo é o cenário desta história emocionante que mostra o amor, a doença e a morte de um grupo de amigos que são separados de forma trágica e penosa. Rasmus (Adam Pålsson) e Benjamin (Adam Lundgren) protagonizam o drama. O primeiro é um jovem da zona rural que vai à cidade grande para se libertar sexualmente, o segundo, Benjamim, mais recluso, é testemunha de Jeová e sai de porta em porta citando passagens da Bíblia. Os dois se encontram numa festa de Natal e inicia aí uma relação de amor, mas também de muito sofrimento.

Benjamin assiste a degradação de seu único amor 

A estrutura da minissérie é muito interessante, a história é contada de forma não sequencial. A infância, a adolescência e a vida adulta dos dois protagonistas são mostrados durante os três episódios, facilitando para o espectador uma conexão emocional com os personagens, além de promover a visão da família e mostrar o preconceito da sociedade sobre esta doença que naquela época, era uma sentença de morte.

Em tradução livre, o título é Nunca Enxugue as Lágrimas sem Luvas, que curiosamente deriva de uma cena bastante significativa no início da minissérie, quando uma enfermeira é repreendida pela colega porque enxugou as lágrimas de um paciente com Aids, sem as devidas luvas. 


Post relacionado:

The Normal Heart  com Mark Ruffalo e Matt Bomer







17 de fevereiro de 2014

Ela (Her)



O criativo diretor Spike Jonze explora em várias camadas os relacionamentos amorosos no tocante Ela (Her, 2013). Durante o filme acompanhamos o nascer e o desabrochar de uma história de amor entre um homem e um sistema operacional, vislumbramos um pouco as consequências de um relacionamento já terminado e há ainda um terceiro que já mostra sinais de desgaste.  É um tema difícil de falar, eu sei, você sabe, mas Jonze conseguiu dizer muito sobre o amor e a difícil tarefa de manter uma relação a dois.

Na verdade, falar sobre o amor envolvendo a tecnologia é um caminho já trilhado pelo cineasta. Anos atrás, Jonze dirigiu um curta, o espetacular Estou Aqui, um história comovente sobre dois robôs que se apaixonam. Se não viu, assista aqui!



Voltando a Ela, Joaquin Phoenix é Theodore, um homem melancólico e solitário, ainda bastante magoado com a separação da mulher. Até que um dia ele instala um sistema operacional em seu computador. A tal tecnologia tem a linda voz de Scarlett Johansson e a capacidade de evoluir e aprender de acordo com a interação que tem, nesse caso, o Theodore. Não basta muito tempo para que ele volte a sorrir e a viver mais por conta da relação agradável e “perfeita” com o computador.

Uma das muitas questões que o roteiro proporciona a gente pensar, é que as pessoas evoluem e se num relacionamento uma das partes não consegue acompanhar as mudanças do parceiro, a relação está fadado ao fracasso. Outra boa sacada do roteiro é tratar a relação homem x computador de forma natural, sem preconceitos, afinal, hoje em dia ter uma relação virtual não é mais uma novidade. No entanto, Jonze faz questão de mostrar, de forma sucinta, que as interações na vida real ainda são insubstituíveis.



Joaquin Phoenix, como sempre, está esplêndido em sua atuação, interagindo na maioria do tempo com uma voz sussurrando no ouvido. É um papel muito diferente do que ele vem fazendo ultimamente. Já a moça da voz, Johansson, mereceria até um prêmio especial por sua colaboração aqui, sua voz transmite alegria, tristeza, espontaneidade, compreensão e afeição não apenas a Theodore, mas ao público também, impossível não reagir a este casal improvável do cinema. Destaque também para a participação de Amy Adams -  sem os decotes e a sensualidade de sua personagem em Trapaça -  amiga do protagonista e que lentamente vai ganhando importância na trama.

Com sensibilidade e muitas cores, além de personagens tão vulneráveis e humanos, Spike Jonze tornou a sua love story um instrumento poderoso, profundo e reflexivo acerca das relações contemporâneas, sejam elas virtuais ou reais.


NOTA: 9,5

14 de fevereiro de 2014

The After: A série apocalíptica de Chris Carter



Oito estranhos se encontram por razões sobrenaturais - e intrigantes - no estacionamento de um edifício. Eles estão presos ali. Incomunicáveis com o mundo exterior, a tensão é crescente, tudo que eles querem é sair dali. Porém, mal sabem eles que lá fora a situação é caótica, o pânico tomou conta da multidão que se aglomera nas ruas e helicópteros colidem acima das cabeças desses reles mortais que a esta altura, já não sabem mais o que fazer ou para onde ir. É o início do apocalipse. Esta é a premissa e um resumo dos primeiros minutos de The After, a aguardada e nova empreitada de Chris Carter, mente genial por trás de Arquivo X, uma das melhores séries da história da TV.



Carter também dirige o primeiro episódio, são 54 minutos muito bem preenchidos com muita tensão, ação, suspense, desespero e um finalzinho chocante pra deixar o espectador morrendo de vontade de ver o próximo capítulo. Como fã de Arquivo X, eu aprovei o piloto, um eficiente exemplar sci-fi do jeitinho que eu gosto. Mas não simpatizei muito com os personagens, apesar de serem figuras interessantes, como o palhaço gay. Mas há uma exceção, D. Love, o ex-presidiário que se diz inocente, me chamou a atenção, é ele quem faz realmente as coisas acontecerem. Mas não se pode desenvolver tantos personagens em um só episódio, o foco do piloto foi mesmo mostrar o medo e a fragilidade humana em condições extremas, e isso, Carter soube transmitir com maestria.



Se depender dos fãs de Arquivo X, The After tem futuro certo, mas infelizmente há um “se” nessa história.  A série foi encomendada pela Amazon (futura concorrente da Netflix) e o público é que vai decidir se The After ganha temporada completa ou não. Ou seja, se você ficou afobado para ver o segundo episódio, pode esperar sentado numa cadeira bem macia. O piloto foi feito apenas para avaliação. O público dos Estados Unidos e da Alemanha votarão nos pilotos de séries e se gostarem do que assistiram, o programa será aprovado. Outros projetos encomendados pela Amazon são Mozart in the Jungle, protagonizado por Gael Garcia Bernal e Transparent, série cuja trama envolve um personagem que fez mudança de sexo.


Para fãs de ficção científica, The After não desagrada e Chris Carter está merecendo mesmo retornar à TV em grande estilo. 

O retorno do seriado, previsto para o início de 2015, com novos oito episódios, não vai mais acontecer. A Amazon cancelou The After, e  por enquanto, não deu nenhuma explicação aos fãs sobre a decisão. Uma pena. (Post atualizado no dia 25 de janeiro de 2015)
 
Assista a prévia:


10 de fevereiro de 2014

The Spectacular Now



O complicado momento de transição da juventude para a vida adulta é discutida sem obviedades no independente The Spectacular Now (2013), queridinho da crítica em festivais no ano passado e assinado pelos mesmos roteiristas do melancólico 500 Dias Com Ela.

Na trama Sutter (Miles Teller, de Projeto X) é um jovem festeiro, o cara popular da escola, o engraçadinho da turma, aparenta ser alguém “vazio”, mas por trás da fachada de nice guy se esconde um ser complexo, com problema de autoaceitação e síndrome de Peter Pan. Aimee (Shailene Woodley, de Os Descendentes) é a garota meiga que vai abalar o mundo de Sutter e ajudá-lo a enfrentar seus medos mais profundos.

The Spectacular Now pode parecer à primeira vista apenas mais um filme de romance juvenil, mas há muito mais nas entrelinhas que se pode imaginar.  Os personagens são investigados com profundidade e subjetividade, sendo assim pessoas com os quais podemos facilmente nos identificar. O desenvolvimento da relação amorosa de Sutter e Aimee flui de maneira natural e soa muito verdadeira. Se no início o interesse de Sutter pela garota é duvidosa, não demora muito para ele se render ao encanto de Aimee e perceber que a vida é mais complicada do que pensa e que o  “viver agora” não basta apenas.

Aimee e Sutter vivem um "espetacular agora".

O diretor James Ponsoldt (Smashed) acertou na escolha dos protagonistas, Shailene e Miles possuem uma química perfeita, o ator mostra bastante potencial para ter uma carreira sólida no cinema ou na TV. Já a jovem atriz, este ano estreia Divergente, um possível sucesso do ano. Os diálogos espertos e a incrível habilidade de James em evitar as armadilhas de clichês, seja na construção dos personagens ou no desenvolvimento da trama, distingue esta obra independente de tantas outras do gênero, que em sua maioria e ao contrário desta, são mais rasas que o pires da minha avó.

Sensível, honesto e bem humorado, The Spectacular Now (ainda sem título em português) é ideal para quem curte filmes que retratam a juventude, e mais, ensina muito sobre a vida e que o futuro, somos nós que fazemos.


NOTA: 7,5

1 de fevereiro de 2014

Trapaça


Já nos primeiros minutos de Trapaça (American Hustle, 2013), elogiado drama indicado a dez Oscars este ano, somos apresentados a um dos melhores trunfos do filme, Christian Bale, surpreendente e brilhante em um papel cômico. Bale ganhou uns quilinhos e uma pança enorme, na primeira cena do filme, seu personagem surge lutando com seus poucos fios de cabelo para encobrir a calvície.  Simplesmente pitoresco!

David O. Russell é um diretor talentosíssimo, sua maior habilidade é tirar o melhor dos atores com os quais trabalha, assim é Trapaça, cujo ponto forte é a notável atuação do elenco e consequentemente, os personagens que interpretam. É aquele típico filme no qual grande parte do público vai sair do cinema comentando sobre situações específicas de algum personagem e não pela história em si, como por exemplo, a cena do Bale que eu falei no início ou o momento em que Jennifer Lawrence canta Live and Let Die loucamente.

Trapaça com elegância

Então já que a principal qualidade do drama é o elenco afiado, vou me ater a ele. Como já disse Bale (nosso eterno Batman) está um arraso, sua capacidade de mudar o físico para um personagem apenas o eleva ainda mais a astro de primeira grandeza, um dos mais destemidos de sua geração. Bradley Cooper, de cabelos enroladinhos, tem uma performance que também merece reconhecimento, embora ele exagere nas caras e bocas em alguns momentos. O fato é que, Cooper tem talento e pode sim ter uma carreira séria e diversificada na tela do cinema (Favor, assistam O Lugar Onde Tudo Termina) e se desvirtuar de papéis em comédias, gênero pelo qual ficou famoso.


No time das mulheres, Amy Adams sensualiza a cada frame, ah aqueles decotes.  Jennifer Lawrence, é sem dúvida o grande chamariz do filme, mostra novamente porque é uma das atrizes mais talentosas e carismáticas do momento. Quem for ao cinema com o único intuito de ver a atriz de Jogos Vorazes não se arrependerá. Não é exagero dizer que a narrativa torna-se mais envolvente quando a sua personagem Rosalyn, esposa de Irving (Bale), entra em cena. Instável, cômica e complexa na pele de Rosalyn, Lawrence ganha a simpatia de todos com um papel tão ousado, é muito bom vê-la em ação.

Em resumo, Trapaça é uma comédia sobre vigaristas que envolvem a polícia, políticos e gângsteres ambientada nos anos 70, por isso a trilha nostálgica e tão conhecida é um pequeno deleite. O. Russell tem um enredo engenhoso e inteligente na mão, mas que poderia ter melhor resultado se a história fosse condensada e mais dinâmica, porém, a riqueza dos protagonistas torna todo o resto em algo não muito relevante. É um bom trabalho do diretor e um dos melhores filmes do ano, mas não o melhor para ganhar o Oscar.


NOTA: 8,0
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