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22 de setembro de 2013

Elysium



Meses depois da estreia de Distrito 9, lá em 2009, muitos se perguntaram se o próximo trabalho do diretor Neill Blomkamp seria tão bom quanto o seu primeiro filme. Todos aguardavam ansiosamente pela nova empreitada do cineasta, que impressionou todo o mundo com o misto de documentário e ficção científica. Bom, Elysium (2013) estreou finalmente e uma coisa é certa: Não é melhor que Distrito 9, ainda assim é um grande exemplar do gênero ficção científica, uma fita de ação eletrizante, isso é incontestável.

Um dos motivos pelo qual Elysium é inferior a Distrito 9 é que o subtexto político e crítica social sustentado no início se perde em meio à correria desenfreada na metade do filme até o seu desfecho.  Mas a obra tem suas qualidades. A construção de um cenário dividido em dois subgrupos é perfeita. De um lado, a Terra, devastada e marcada pela pobreza extrema e exploração do povo por grandes corporações. Do outro, a tranquilidade, a beleza e a riqueza de Elysium, cujo mundo é comandado com frieza por Delacourt, vivida por Jodie Foster.

Moura e Damon: atuação do brasileiro foi elogiada

É na Terra que se concentra os mais importantes personagens da produção, como o protagonista Max, interpretado pelo sempre competente Matt Damon. Após sofrer um acidente na fábrica onde trabalha e ser exposto à radiação, Max procura um hacker do submundo chamado Spider, Wagner Moura em uma atuação esplêndida e bem a vontade com o idioma ianque. Após ser transformado numa espécie de homem-máquina, Max tenta ir a Elysium de qualquer maneira. Nesse contexto ainda estão as personagens de Diego Luna, Alice Braga e Sharlto Copley. Damon e Foster estão bem e reconheço, mas são dois coadjuvantes que roubam a cena, o nosso querido Wagner Moura e Copley, interpretando aqui um mercenário pervertido e repugnante.

Copley se destaca como um vilão furioso

Ressaltando, Elysium é um bom filme e vale o (caro) ingresso do cinema, prende a atenção do espectador durante quase duas horas de duração e Blomkamp mostra-se muito hábil nas empolgantes cenas de ação, porém o maior “pecado” do cineasta foi ceder à correria incontrolável típica dos filmes de ação hollywoodianos, e desse modo, a produção culmina em um desfecho sem muita emoção e nos importamos bem menos com as personagens, nessa altura, os flashbacks de infância de Max que no início tinha o intuito de nos sentir mais próximos do protagonista, já não nos comovem mais.


NOTA: 7,5

20 de setembro de 2013

Ficção Científica: O cinema para refletir



Muitos veem a ficção científica, ou melhor, os filmes do gênero, como algo feito apenas para os nerds, costumam apelidá-los de "filmes espaciais", "filmes de monstros", isto não é apenas eu que estou dizendo, esta convenção coletiva foi confirmada por Wagner Moura no ótimo Saneamento Básico – O Filme, de Jorge Furtado. Mas a FC (vou abreviar assim o termo ficção científica) é mais que um gênero cinematográfico. É o espelho do mundo e do caos vivido em certo período, é uma crítica aos governos, é um meio de alertar as pessoas, dar um ’’puxão de orelha’’ sobre um tema considerado mais preocupante da época vigente.
                             
Em 2009, Keanu Reeves ficou encarregado de nos alertar sobre a desenfreada supressão do meio ambiente, a questão, ainda é válida e discutida ainda mais nos dias de hoje. Em algum momento do longa-metragem O Dia em que a Terra Parou ele diz: “não podemos continuar no planeta, pois estamos destruindo-o’’. A frase é citada nesta refilmagem de uma produção de 1951, e que naquele tempo, passara uma outra mensagem.

Em O Dia...o alerta vem de outro mundo

Nos anos 50, o mundo vivia com medo, receio de uma iminente guerra, países trocavam ameaças e se abasteciam de armas poderosíssimas, uma provável guerra nuclear afligia a todos. E a mensagem para as pessoas e para os governos na versão original era, "parem de fazer ameaças entre si ou todo o planeta será destruído’’. A nova versão de O Dia em que a Terra Parou, chama a atenção do público para a importância da preservação ambiental e faz um apelo para que a gente cuide melhor do lugar onde vivemos. É um filme que te induz a pensar o quão destrutível nós somos. A problemática ambiental também foi descaradamente discutida no surpreendente Avatar.

Outros clássicos da FC também refletem algumas etapas - nada agradáveis - pelo qual a humanidade passou em certos momentos. A obra-prima de Terry Gilliam, Brazil (1985), apresenta um mundo tomado pela burocracia e pela repressão, características dos tempos da ditadura. Metropolis é outra cultuada ficção, filme mudo de 1927, mas com um tema ainda bastante atual. Trata-se de um futuro onde os trabalhadores (pobres e que vivem no subsolo) são obrigados a trabalharem 10 horas por dia para, obviamente, sustentarem os poderosos. Não sei por que, mas acho que o diretor Fritz Lang tinha uma bola de cristal, não é?

Brazil: Quando a burocracia voa pelos ares

Outro caso relevante a comentar, é Distrito 9, ficção científica com toques de documentário e que surpreendeu  o mundo como uma empolgante fita de entretenimento mas que apresentava um conteúdo crítico e audaz sobre a sociedade. O filme começa com relatos de pessoas que tiveram contatos com os alienígenas, chamados de langostinos, que por alguma razão, dividem há vinte anos espaço com os humanos em uma favela da cidade Joanesburgo, África do Sul.

Em resumo, os visitantes vivem em uma terra estranha, se alimentam do lixo produzido por humanos e são alvos de discriminação e de pedras, tornando-se seres inferiores porque foram privados de auxílio à saúde, comida, lugares decentes para viver, além do esquecimento do governo. Algo semelhante ocorre com alguns povos do planeta. É praticamente a nossa realidade, mas somos inferiores a qualquer tipo de ser vivo que exista, pois marginamos e discriminamos indivíduos de nossa própria espécie.

Distrito 9: a união entre humanos e langostinos 
restringida ao monumento 
                   
Esta semana chega aos cinemas Elysium, o novo filme do diretor de Distrito 9, Neill Blomkamp, é mais uma produção caprichada e que também trará uma trama bem politizada, focado agora nas desigualdades sociais, em um mundo dividido por duas classes, a pobre e a rica.

A ficção científica é assim, mais que filmes-catástrofes feitos com o único intuito de diversão, é um reflexo da sociedade e de seus problemas, é sempre um convite à reflexão individual acerca do mundo lá fora. Mais pessoas deveriam estar mais atentas nas mensagens transmitidas pelas obras do gênero.

12 de setembro de 2013

O Negócio



A profissão mais antiga do mundo é também a mais criticada, no entanto, é a que mais desperta a curiosidade do público, talvez por isso, O Negócio (2013), série que tem como protagonistas três jovens e lindas prostitutas de luxo, tenha despertado interesse tanto dos idealizadores do programa quanto do público que está acompanhando o seriado. A produção é da HBO Latin America, e claro, tem a qualidade e a sensualidade típica dos produtos do canal.

A premissa é original e promissora. Duas garotas de programa resolvem aplicar os conceitos de marketing no trabalho com o objetivo de melhorar os lucros e atrair mais clientes. “Só porque é a profissão mais antiga do mundo não significa que tem que ser a mais atrasada”, dispara Karin, a prostituta visionária vivida por Rafaela Mandelli. Bom, vamos falar das garotas.

Rafaela Mandelli (sim, ela já fez Malhação) é Karin, belíssima, sedutora, empreendedora e a mais inteligente das três. Quando não está fazendo “programa”, está vendo palestras e lendo livros de marketing.
Luna (Juliana Schalch, do filme nacional Os 3) é a mais simpática, com um sorriso grande e encantador, tem como “projeto de vida” fisgar um milionário e não está muito interessada nas ideias de marketing de sua amiga. É a narradora da série.
Michelle Batista vive a despreocupada e despojada Magali, prostituta que não tem a elegância de Karin e Luna, porém, aos poucos vai conquistando a confiança e simpatia das meninas e do público. Sua personagem aparece apenas a partir do segundo episódio e lentamente vai ganhando importância na trama.

Magali, Karin e Luna.

As três personagens são o maior trunfo da série, impossível não ficar envolvido com os dramas e as aventuras das garotas, principalmente Karin e Luna. Torço muito para que as estratégias de marketing aplicadas por Karin dêem certo e para que Luna consiga se salvar das enrascadas em que se mete por causa da sua vida dupla. As intérpretes podem não ter encontrado o tom certo na atuação no primeiro episódio, mas o aprimoramento vem nos episódios seguintes. 

A série exala sensualidade em cada frame, sem vulgarizar, a produção é cheia de estilo e elegância, mas não é perfeita. O episódio piloto tem um ritmo lento, o que pode afastar o público impaciente, mas tudo melhora a partir do capítulo seguinte. Outra coisa, os diálogos soam didáticos demais em alguns momentos. Outro ponto baixo é a atuação cheia de canastrice do Guilherme Weber, o cafetão para quem Karin trabalhava. O ator ainda não encontrou o timing certo, pelo menos até o quarto episódio.  Vou torcer para que ele me conquiste, pois é uma personagem importante na história.

Juliana Schalch e Gabriel Godoy repetem a parceria do filme Os 3


O Negócio é a primeira produção nacional da HBO que me vicio realmente, estou gostando bastante. A narrativa poderia ser mais dinâmica, é verdade, mas é uma série que promete muito, e claro, aborda um tema polêmico e pouco explorado na TV, o que já é um chamariz e tanto.  A combinação de marketing e meretrício parece que agradou, O Negócio já foi renovado para a segunda temporada. Que negócio maravilhoso.

8 de setembro de 2013

Jobs (2013)



Um retrato honesto, mas incompleto de uma das figuras mais icônicas e importantes do século, Steve Jobs, o co-fundador da Apple, assim pode ser definida a cinebiografia Jobs (2013), dirigida pelo desconhecido Joshua Michael Stern e com Ashton Kutcher no papel principal.

Jobs é um bom filme, mas tem muitas falhas, e acredite, Ashton Kutcher não é uma delas. Se o maior medo do público era a atuação de Ashton, fiquem despreocupados, o ator fez o dever de casa correto, incorporou muito bem o modo de andar e gesticular do homem visionário e entregou uma performance esforçada, sólida e que nada lembra o “cara”  das caretas de  That 70´s Show e Two and a Half Men.

Já que estou falando de pontos positivos, a “humanização” de Steve Jobs a  fim de ressaltar suas falhas e mostrar que além de gênio ele era imperfeito e de difícil personalidade, foi bem desenvolvida pelo roteiro. As cenas em que ele vende suas primeiras placas de computador e aquela em que ele despede um engenheiro da Atari – minha cena favorita – dizendo em alto e bom som: “Você não compartilha do nosso entusiasmo”, reflete bem a genialidade e as suas características menos aprazíveis. Ah, os fãs também vão vibrar com o momento em que ele cria o nome da empresa.

Jobs e Wozniak no início de tudo.

Josh Gad (Amor e Outras Drogas) e Dermot Mulroney (O Casamento do meu Melhor Amigo) que interpretam respectivamente Steve Wozniak – que fundou a Apple junto com Jobs – e Mike Makkula – o investidor – também se destacam como coadjuvantes e vale a menção aqui.

São muitos os pontos negativos da produção que custou apenas R$ 12 milhões de dólares. Primeiro, a trilha sonora constante e desnecessária em algumas cenas. Usar músicas seja instrumental ou não para atribuir emoção à cena, me pareceu amadorismo demais. Segundo, a opção por priorizar o lado “corporativo” de Jobs e a sua jornada cheia de altos e baixos  tornou dispensável a subtrama sobre o seu lado pessoal. Mal desenvolvida, a história da filha que ele na queria reconhecer retratada no início, é esquecida durante grande parte do filme e reaparece no último ato sem nenhum impacto ou qualquer explicação. Assim acontece com a relação entre Jobs e seu parceiro Wozniak, se no início do filme mostrava potencial, já na segunda meia-hora já esquecemos  da personagem. Como verdadeiro parceiro de Jobs na vida real, ele merecia mais atenção. Para complementar, o co-fundador Wozniak criticou este filme e disse que sua relação com Jobs foi retratada erroneamente. Isso eu percebi.  Em tempo, vale comentar que Wozniak está trabalhando em outra cinebiografia sobre Steve Jobs.

Jobs apresenta a Apple.

Os excessos na trilha sonora, os personagens que vão e vêm inexplicavelmente, como já citado, o drama ainda peca pela ausência de passagens importantes da vida de Jobs como a compra da Pixar Studios e a sua doença, faz de Jobs uma cinebiografia ainda não definitiva e limitada. A produção, mais longa do que deveria, entretém aos fãs do homem do Ipod e a quem deseja conhecer melhor sobre este visionário, no entanto, fica a sensação de que a história poderia ser mais bem contada.


Nota: 7,0

5 de setembro de 2013

Eden Lake (Sem Saída)



A soma de um sistema educacional falho com lares disfuncionais pode criar os piores tipos de seres humanos. Esta é a base do elogiado Sem Saída (Eden Lake, 2008), thriller psicológico violento que passou despercebido pelo público brasileiro na época, mas que ainda merece toda a nossa atenção. A produção conta com Michael Fassbender - um pouco antes de cativar Hollywood em Bastardos Inglórios - um dos astros mais requisitados do momento e um dos meus atores preferidos da atualidade.

A trama é simples. Steve (Fassbender) e Jenny (a exótica Kelly Reilly de O Voo) formam um casal adorável e apaixonado. Eles vão passar o final de semana em um lago um pouco distante da civilização. Lá, se deparam com um grupo de adolescentes que transformarão o fim de semana em um inferno sangrento.



Sem Saída pode parecer clichê e genérico, mas não se engane. Graças ao roteiro inteligente, ácido e (muito) ousado de James Watkins (que também dirige o filme), o thriller tem muitas qualidades que o diferenciam de qualquer outro filme do gênero, como o desprendimento total em relação aos personagens e o final, no mínimo, estarrecedor. Mas não é só.

Eden Lake – prefiro o nome original do que o título em português, que também é o nome de um filme com Taylor Lautner – não usa a violência de forma gratuita, discute de forma severa uma questão polêmica: a inserção de jovens na criminalidade em razão da liberdade e má educação dada pelos pais, e para piorar o quadro, são adolescentes que se recusam a frequentar uma escola por não se adequar às regras estabelecidas pela instituição. Logo no início do filme, ouvimos pelo rádio uma discussão sobre este assunto, mas não podemos prever o que está para acontecer.


A temática da vivência em um determinado grupo social no qual um ser individual não tem voz própria e é obrigado a fazer o que o grupo – ou o líder – manda é abordado aqui de forma contundente e extremamente realista. Interessante ver também a desconstrução da personagem Jenny, professora, ela passará por situações terríveis perpetradas por adolescentes e que acenderá em si um lado negro que ela nunca conheceu antes.

Brutal, intenso e urgente, Eden Lake deveria até passar nas reuniões de pais nas escolas, não custa nada prevenir possíveis “monstros” na sociedade. Por coincidência, o drama A Caça, leia a crítica, que vi recentemente, tem uma trama que também envolve educadores que têm suas vidas “transformadas” por crianças e/ou adolescentes, cujas famílias sofrem do excesso de protecionismo. Assista ao trailer.  

NOTA: 8,0

1 de setembro de 2013

A Caça (Jagten)



O comentário de uma criança sobre um professor toma proporções gigantescas e causa danos devastadores e irreparáveis à vida de Lucas. Lucas é o educador acusado de abuso sexual infantil no filme dinamarquês A Caça (Jagten, 2012) do cineasta Thomas Vinterberg. Mads Mikkelsen (astro da trilogia Pusher de Nicolas Winding Refn, Cassino Royale e da série Hannibal) encarna com sensibilidade o professor que tem a cidade inteira contra ele após o infeliz e inocente comentário da menina Klara. A adoração da garota pelo professor é tão grande que, depois de levar uma leve repreendida dele, ressentida, ela diz à diretora do colégio que Lucas mostrou o seu “pipi” para ela.

Lucas é um profissional ímpar, dedicado, brinca e tem uma paciência de Jó com as crianças, infelizmente suas qualidades tornam-se irrelevantes  e não impede que a história do “pipi” saia para além das portas da instituição. Grethe, a diretora, logo leva o fato aos outros pais e o estrago está feito. Grethe representa aqui, aquelas pessoas que precipitadamente julgam as outras sem considerar o seu histórico e não se preocupam em dar espaço às dúvidas.

A menina Klara e sua imaginação fértil.

A questão mais difícil abordada em A Caça não é o caso do (suposto) abuso sexual, mas a manifestação social que vem depois. Lucas (que interpretação magnífica de Mads, não à toa levou a Palma de Ouro em Cannes de Melhor Ator em 2012) tem sua vida devastada, é agredido nas ruas, todos o tratam com hostilidade, como um doente mental, exceto o seu filho Marcus. A cena em que Lucas e seu filho estão na mesa conversando e Marcus chora copiosamente é comovente, tão verdadeira que fica difícil conter as lágrimas.

Thomas Vinterberg constrói um filme focado na relação de Lucas com a comunidade - que decide aceitar o fato a esperar pelo resultado da investigação - e a sua família,  sabiamente o diretor dispensa o lado investigativo da história. Em A Caça, a trilha está mais contida, bem diferente do ótimo filme Querida Wendy, que tocava The Zombies a todo instante. Vinterberg também faz algo interessante, utiliza-se da pouca luz em algumas cenas para representar o estado emocional dos personagens, como nos momentos de dor, raiva ou desgosto.

Mads: Atuação digna de Oscar.

A Caça tem muitos detalhes na trama que requer muita atenção do espectador, alguns traços do roteiro são implícitos dando margem para muitas interpretações, principalmente nas cenas derradeiras, tornando o filme uma experiência riquíssima do ponto de vista psicológico. Perturbador, reflexivo, o longa retrata a injustiça de uma forma pura, sem qualquer tipo de pirotecnia ou exagero na trama ou nas ações. O drama conta a história de um homem que tem o caráter questionado e que, provando-se inocente ou culpado, terá a sua vida assombrada para todo o sempre. 

NOTA: 9,5
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